quinta-feira, 16 de abril de 2015

AMUSALANA

          Caminho por um parque, no qual há quase tudo que se imagina haver em um, o lusco-fusco invade-o.
 
          Quando de chofre vislumbro um ser bem menos lusco-fusqueante, sua fulgurância era tamanha que seria percebida mesmo que à luz das noites não-satelizadas..
 
          Sentada em um banco para um trio ou um quarteto convidava no silêncio quem a pudesse acompanhar em múltiplos sentidos.
 
          Pensei: a minha matemática é evoluída em comparação à sua, incipiente; o meu mapa está deveras riscado, por tantas trajetórias, o seu, apenas os viçosos relevos; as minhas cobertas são raras, as suas, negrejantes, espaçosas e límpidas.
 
          Cruzo, admiro, inspiro-me, respiro, suspiro, expiro e reflito. Retorno, tergiverso, enfim, pergunto: — Desculpe-me a ousadia, permitir-me-ia lançar mão das ideias lumierianas e transcrever a beleza múltipla deste cenário? Este crepúsculo, o seu veículo dobrerrodas que a ladeia e a protege, as suas vestes combinantes e realçantes como Le rouge et le noir, de Stendhal, o seu longo calçante que perpassa a dobra dos membros andantes; porém, com o realce da perscrutação da obra de outro francês, Albert Camus. E, se ainda não bastasse, as folhas de Platanus Acerifolia esvoaçando ao derredor.
 
          Ela concede-mo sem consternação, confessa-me que amiúde o faz sem a permissão de outrem.
 
          Simula a volta ao devaneio com a celulose e as tintas, porventura, oferece a naturalidade que tem apresentado. Tomo a melhor posição, aguardo a ausência dos disturbios, pronto, pressiono o obturador do meu ultrapassado smartphone.
 
          Reaproximo-me, mostro-lhe, sorri-me com a graça que, à lonjura, se me apontara.
 
          Inquiro-lhe o nome, diz-mo; um bonito para uma além da lindeza.
 
          Há os os que dizem que natureza é perfeita, o que dubitável, contudo, às vezes, ela exagera na perfeição, e têm-se as aquinhoadas de tudo. A minha musa é um desses espécimens.
 
          Agradeço-lhe, afasto-me. Um mancebo ao meu lado vocaliza algo incompreensível, pergunto-lhe, nega-se a desfraldar o enigma. Reinsisnto, ele acede, diz que um dia foi bom naquilo. Não entendo, pergunto mais, ele insinua que eu paquerava a musa, neguei, o que era fato. Disse-lhe que lhe pedira para eternizar aquela beleza museana com o auxílio dos pixels. Ficou embasbacado e incrédulo pelo vira ou pensou que vira.
 
          Sorriu sem cor, seu companheiro chamou-o, despediu-se e seguiu seu caminho.
 
          Foi-se sem a imagem que tive, todavia, eu a tenho duplamente.
 
                                                                                                  14/04/2015

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