Curitiba, estado do Paraná, desde há alguns meses, tem
tornado-se um imenso dormitório a céu aberto, ou quando não, com
teto, sem portas, janelas e paredes. Pessoas fazem-no nas praças,
nas calçadas, debaixo de pontes ou marquises de prédios públicos e
privados.
Não importa para o que seja, ninguém é
obrigado a ter dinheiro, tanto é verdade que muitos de nós não o
temos para boas moradias, roupas, férias e diversões. E muito pior
do que para esses —
os quais podem ser considerados, por alguns, como supérfluos —
é quando não o possuímos para a obtenção dos meios necessários
para satisfazer as nossas necessidades básicas, conforme a
hierarquia de necessidades, de Abraham Maslow, visto que sem elas a
existência torna-se um caos.
Há os que são contra a propriedade
privada, eu não o sou, e nem um pouquinho contra a pública, desde
que, de verdade, atenda ao povo.
O que não quer dizer que eu possa
ocupar certo patrimônio público em detrimento de outrem. O que é
público pertence a todos, e não a determinado a alguém.
O vendedor ambulante —
se satisfizer as exigências da vigilância sanitária e recolher os
devidos impostos —
deve ter o direito de ir e vir vendendo o
seu produto. Porém, se tornar-se estático e ocupar uma área
pública, seja em cima de calçada, ou mesmo área de rolagem de
veículos, os quais são áreas de locomoção comum, onde muitos
querem transitar, ele passa a ocupar um espaço público e perturba
os demais, como se privado fosse.
O mesmo ocorre com o flanelinha —
cuidador de carro —
que ocupa um espaço público e extorque outros cidadãos com a
conivência do poder público. Se alguém ousar a não lhe pagar pode
ser ameaçado, e alegar que o corajoso caloteiro quer atrapalhar o
seu ofício. Eis a pergunta: quem precisa dele ou do seu trabalho?
Você precisa? Eu, não!
Dentre tantos que querem grilar o
território público, há o dormidor em espaço público, e o faz a
qualquer hora como se fosse a sua casa —
o que de fato o é—,
alguns encenam gestos e palavrórios obscenos, alguns outros
ameaçam transeuntes, mormente mulheres.
Realmente, ninguém é obrigado a ter
posses ou poder de compra, porém, os que se encontram naquela
condição não deveriam obrigar outrem a aspirar fragrâncias
indesejáveis, ver dejetos animais ou humanos e, às vezes, pisá-los.
Sabe-se que há muitos casos de
insanidade mental e/ou dependência química. Esses são de
responsabilidade do poder público. O SUS (Sistema Único de Saúde)
não é para todos, assim, como os espaços públicos?
Os brasileiros —
às vezes, estrangeiros também —
que ocupam as vias públicas como suas residências têm as suas liberdades de ir e vir, como diz a
Constituição Federal, mas como ficam os outros no que tange ao
mesmo direito? Não têm direito aos espaços públicos em que há
dormidores (habitantes), visto que esses tornam os locais exclusivos
e imundos? Onde está estatuído que se pode ocupar espaço público por tempo indeterminado?
Não se pode obrigar alguém a dormir em um albergue institucional, contudo, ocupar com exclusividade alguns espaços públicos pode! Não há incoerência nesse impasse? 29/08/2014